quarta-feira, 28 de maio de 2008

Depoimentos

Sempre que abro um livro infantil e as ilustrações me encantam, pergunto-me: Por que isso acontece? Desnudo-me de preconceitos e tento compreender o porquê por meio de diversos aspectos. Como tenho muito interesse pelas cores, geralmente esse é o primeiro aspecto que me chama a atenção. Será a forma como o ilustrador usou as cores? Alguns são mais racionais, buscando harmonia ou contraste de uma forma mental. Outros são mais orgânicos e brincam com as cores de forma inusitada. Penso na composição. Esse é um dos aspectos que acho mais difícil. Onde colocar cada elemento da imagem. Criar tensões ou surpresas, orientar o olhar para detalhes relevantes da narrativa. Olho a forma. Vejo como o ilustrador definiu as personagens e a paisagem: se usou volume ou se as figuras são planas; se é uma representação naturalista ou expressionista; se tende a um abstracionismo. Observo como a linha foi utilizada: de forma mais definida, contínuas ou linhas interrompidas, soltas. Busco conhecer sua caligrafia, como costuma representar os elementos narrativos, que influências reconheço em suas imagens, que soluções ele encontra para determinadas encruzilhadas que o texto impõe. A técnica usada sempre me chama a atenção. Gosto particularmente de técnicas que são uma metáfora do texto. Procuro na narratividade da imagem a história que esta se propôs contar, sua relação com o texto, o quanto enriqueceu minha leitura, quais expectativas foram quebradas e que aspectos novos, lúdicos, reflexivos estão postos. Claro que toda essa análise é feita depois que a ilustração já me tocou. Na realidade, o processo de encantamento não se dá assim, compartimentado. Todos esses elementos vêm juntos ao nosso encontro e é a unidade que importa. E como saber se essa unidade faz com que a ilustração tenha qualidade? A resposta a essa pergunta me leva para o reino da subjetividade. Para mim, a ilustração tem qualidade quando nos revela a relação de verdade que o ilustrador tem com a imagem que ele produz. Não basta usar todos esses elementos de forma competente. Já vi inúmeras ilustrações primorosas, em termos técnicos, mas que não criam impacto nem empatia. Como se dá essa verdade? É quando temos acesso à energia criativa do artista? Quando há uma entrega honesta na hora da criação? Ou é quando um anjo pousa em seu ombro? Não sei. Posso passar horas aqui levantando hipóteses e teorias para no final concluir que não sei responder. Só sei sentir.


Texto publicado no livro O que é qualidade em ilustração no livro infantil e juvenil, organizado por Ieda de Oliveira, DCL.

4 comentários:

bonina disse...

tão lindo esse texto, mulher. e se tu, que sabe tudo, só sabe sentir, é uma ótima dica pra gente.
;)

beeeeijos!
diana

Fabio disse...

Este texto nobre me fez lembrar de quando vi uma ilustração sua pela primeira vez. A sensação de encanto, o aconchego quase sólido, o instante antes efêmero e agora eternizado no meu quarto de boas lembranças.

D.Ramírez disse...

Bem legal seu blog!!!:)abração!!

Anônimo disse...

Rosinha,

amo a literatura: adulta, infantil, juvenil...amo livros. Convivo com vários autores e ilustradores.
Suas dúvidas são as mesmas que a de todos nós: é a beleza das cores, a harmonia, o contar a história "historiando" desenhos?
Também não sei. Deixo isso com os Anjos ilustradores.
Beijos,
Ana